sábado, dezembro 14, 2024
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Os assassinatos de índios milionários que levaram à criação do FBI nos EUA

No início do século 20, integrantes da nação indígena americana osage se tornaram as pessoas mais ricas do mundo – mas, de repente, começaram a aparecer mortos, um atrás do outro.
 
Essas mortes misteriosas viraram um dos primeiros casos investigados pela agência que viria a ser conhecida mundialmente como FBI (Federal Bureau of Investigation, ou Agência Federal de Investigação).
 
A história é o tema de um novo livro chamado Killers of the Flower Moon: the Osage Murders and the Birth of the FBI (Assassinos da Lua de Flores: os Assassinatos de Osage e o Nascimento do FBI, em tradução livre), do americano David Grann.
 
“A nação osage, assim como outros povos indígenas dos Estados Unidos, foram expulsos de suas terras para uma região no nordeste de Oklahoma”, conta Grann à BBC.
 
“Pensavam que essa região não tinha qualquer valor. Era rochosa e infértil. Mas depois, sob a reserva deles, descobriram um dos maiores poços de petróleo do país”, explica o autor.
 
“E assim os osage se tornaram a gente mais rica do mundo”.
Grann diz que, a partir daí, os osage romperam com todos os estereótipos que se tinha até então de povos indígenas.
 
Os jornais da época falavam da exorbitante riqueza de quem chamavam de “os milionários vermelhos”, que viviam em mansões, vestiam casacos de pele, usavam joias caras e tinham empregados brancos.
 
Muitos viam indígenas como “primitivos” e “selvagens”, e achavam que estes não se prestavam à imagem de pessoas com dinheiro e poder.
 
E logo, alguns osage começaram a desaparecer misteriosamente ou a morrer assassinados. Até o início da década de 1920, dezenas de osage haviam sido encontrados mortos.
 
‘Uma mulher extraordinária’
Em seu livro, David Grann investiga uma família em particular.
“Acompanhei o caso de uma mulher extraordinária, chamada Mollie Burkhart, que nasceu em território indígena em Oklahoma e falava o idioma osage”, explica o autor.
 
“Em um período de uns 30 anos, a mulher passou a viver numa mansão, casou-se com um branco e começou a falar inglês. E sua família passou a ser o alvo de uma conspiração para matá-los.”
Mollie tinha três irmãs – todas foram assassinadas. Uma foi envenenada, outra foi morta a tiros e a última morreu em uma explosão.
 
“Alguém colocou uma bomba sob sua casa e a explosão matou a irmã de Mollie, seu cunhado e um empregado branco que vivia na casa com eles”, disse Grann.
 
Durante sua pesquisa, Grann descobriu que esses incidentes não poderiam ter ocorrido sem a cooperação das próprias autoridades que, no mínimo, faziam vista grossa aos atentados.
 
As mortes foram organizadas por uma poderosa rede, que estava de olho nos milhões de dólares dos osage.
“Tratava-se de uma conspiração, com participação de médicos, que ajudaram a envenenar os osage, de empregados de funerárias que encobriam os assassinatos, de jornalistas que se recusaram a escrever sobre as mortes e agentes da lei que foram diretamente cúmplices nas mortes ou indiferentes a elas porque se tratavam de indígenas. E para o sistema, ‘essas vidas não importavam'”, pontua o autor.
 
Mas aí entrou em cena um jovem funcionário público chamado J. Edgar Hoover, que dirigia um escritório que Grann descreve como um “ramo obscuro” do Departamento de Justiça, chamado “Escritório de Investigações”.
 
Os assassinatos dos osage foram o primeiro caso de Hoover e a primeira investigação importante de assassinato do que logo passaria a se chamar de FBI.
 
“Inicialmente, o FBI foi ligando uma coisa a outra”, disse Grann. “E chegou a um bandido chamado Blackie, que havia acabado de ser liberado da prisão e que os investigadores acreditavam estar usando como informante”.
 
“Mas eles acabaram perdendo Blackie de vista. Ele roubou um banco e matou um policial.”
 
‘Sujeito diabólico’
“Este era o início da carreira de Hoover e, ainda que pareça difícil acreditar, ele se sentia inseguro no trabalho”, explica o autor.
“Assim, para evitar o escândalo (do caso Blackie), ele entregou o caso a um guarda florestal do Texas chamado Tom White, que organizou uma equipe que incluía aquele que era o único indígena do departamento.”
 
Os agentes se infiltraram na região e, utilizando as mais avançadas técnicas de investigação na época, começaram a destrinchar e expor uma das maiores conspirações da história dos Estados Unidos.
 
Na investigação, eles descobriram um homem a quem Grann chama de “um dos piores e mais diabólicos sujeitos que já conheci em todos os meus anos de repórter”.
 
Era um homem chamado William Hale, que tinha se mudado para o território dos osage no início do século 20.
“Havia chegado como um homem sem passado: ninguém sabia de onde vinha, estava vestido com trapos, viajando a cavalo e não tinha nenhum dinheiro.”
 
“Mas pouco a pouco ele foi se tornando cada vez mais poderoso, acumulando terras e gado, e logo passou a controlar todo o território, até ser conhecido como ‘rei das colinas de osage'”, afirma David Grann.
 
‘Controlava todos na comunidade’
“Era um homem com uma aparência benévola, que parecia um professor da escola, que fazia com que todos confiassem nele. Todos o viam como um verdadeiro amigo do povo osage.”
 
Eventualmente, Hale, juntamente com outras pessoas, foram apontados como autores dos assassinatos daqueles indígenas.
Descobriu-se que ele havia enganado, intimidado, mentido e roubado os osage. E, por fim, resolveu matá-los por sua sede de poder.
 
Hale e um grupo de homens foram culpados, condenados e presos por assassinato. Mas depois de um tempo, entretanto, acabou sendo perdoado.
 
Segundo David Grann, esse perdão teria sido um “favor” de alguns amigos políticos.
 
“Dizia-se que Hale controlava todo mundo na comunidade, do xerife ao prefeito e ao governador.”
 
Grann conta que, apesar de terem descoberto os assassinos que matavam osage, a maioria deles acabou em liberdade.
 
A investigação revelou uma série de crimes e barbaridades. Mas, acima de tudo, expôs a frieza e o preconceito com que eram tratados os indígenas nativos dos Estados Unidos.
 
Fonte: BBC/ Globo
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