‘Vamos poder fazer de tudo, como trocar fralda e dar banho’, comenta mãe.
Após 10 dias da cirurgia em que Sofia Gonçalves de Lacerda, de um ano e três meses, foi submetida para a troca de cinco órgãos, a mãe da menina, Patrícia de Lacerda, na tarde desta segunda-feira (20) afirmou que a menina foi autorizada pelos médicos a deixar a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Jackson Memorial Hospital, em Miami, nos Estados Unidos. Segundo Patrícia, o quadro da menina não é mais considerado de alto risco. “Os médicos disseram que ela está se recuperando bem e que o quadro dela não é mais de UTI. A Sofia ainda precisará de muitos cuidados, mas todos os procedimentos poderão ser feitos no quarto”, diz. A menina vai continuar internada no mesmo hospital, informou Patrícia.
Sofia nasceu com Síndrome de Berdon, uma doença rara que causa a má formação de vários órgãos do sistema digestivo. No transplante, a criança recebeu estômago, fígado, pâncreas, intestino delgado e cólon. Não foi preciso trocar um dos rins, como foi anunciado pelos médicos antes do procedimento. Os órgãos doados eram de um bebê do estado da Flórida, segundo a mãe.
Sofia sequer conheceu a casa dos pais, em Votorantim (SP), já que sempre ficou hospitalizada. A menina chegou a ser submetida a três procedimentos cirúrgicos no Brasil, mas ainda necessitava de atendimento especializado para a síndrome rara e para o transplante multivisceral, que não é realizado no país. A transferência para os EUA só aconteceu por determinação da Justiça, que ordenou que a cirurgia, estimada em R$ 2 milhões, fosse paga pelo governo brasileiro.
Ainda de acordo com Patrícia, a troca dos órgãos já permite melhoras físicas na menina. “Ela está desinchando e a cor da pele melhorou muito. Tudo isso porque os órgãos estão funcionamento normalmente. Os enfermeiros continuarão à disposição dela no quarto, mas agora poderemos fazer de tudo, como trocar fraldas e dar banho”, comenta a mãe de Sofia.
Já está no quarto
A menina já está aprendendo a fazer coisas comuns do dia a dia de muitas crianças, mas que antes ela era incapaz de fazer por causa da doença rara que afetou todo o sistema digestivo. A bebê agora aprende, por exemplo, a comer e até mesmo a arrotar. “Às vezes, ela chora por estar sentindo coisas novas no seu organismo. Isso é causado pelos alimentos, coisa que ela não conhecia. Ela sente que algo está acontecendo na barriguinha dela e fica com medo”, comenta a mãe.
A menina começou a receber as primeiras alimentações da vida por meio de soluções administradas diretamente em sua barriga, apenas cinco dias após a cirurgia. Antes, Sofia se alimentava por uma nutrição que era introduzida em seu organismo por uma veia localizada próxima ao coração. “Era um tipo de soro com todos os nutrientes que o organismo dela precisava, chamada de parenteral”, lembra a mãe.
Enquanto o organismo ainda está se adaptando com os novos órgãos, ela tem se alimentado com um produto especial. “É como se fosse um leitinho, que está sendo introduzido através de uma sonda para ela”, explica a mãe.
Por conta da digestão do alimento, Sofia tem experimentado novas sensações e chega a se assustar com um simples arroto. “Toda vez que ela arrota, acaba gritando. Penso eu que por achar que vai doer, já que ela nunca tinha feito isso antes. Ela me olha como se quisesse me perguntar ‘o que está acontecendo? Eu nunca senti isso antes'”, acredita a mãe.
Como a menina não está mais sendo sedada, ela tem sentindo algumas dores, que, segundo Patricia, são normais por conta do procedimento cirúrgico a que ela foi submetida. “Ela está meio tristinha, pois toda sedação foi embora. Ela acaba ficando mais tempo dormindo, mas quando acorda sempre se demonstra bem, apesar de tudo”, afirma.
O transplante de Sofia teve também a participação dos médicos brasileiros Rodrigo Vianna e Thiago Beduschi, que fez a captação dos órgãos do bebê doador. A participação de dois brasileiros na luta pela vida da menina é motivo de orgulho para Vianna. “No meio de tanta notícia ruim, pelo menos a Sofia leva um pouco de esperança de que podemos fazer o que é certo para o nosso povo. Ver a luta da família e o carinho da nossa gente tem sido uma sensação muito gratificante. O futuro é imprevisível, mas pelo menos existe a chance de recomeçar a vida. E isto não tem preço”, finaliza.
Fonte: G1