quinta-feira, maio 2, 2024
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Grupos no Havaí lutam por independência e fim de “ocupação” americana.

O Havaí vai começar a decidir em fevereiro de 2016 sobre a criação de um governo próprio formado por nativos e como o arquipélago deverá ser gerenciado no século 21.
As primeiras votações para eleger delegados que vão participar da convenção, ou ‘aha, já estão ocorrendo. Serão 40 delegados de todas as ilhas que formam um dos 50 estados americanos – e o mais novo do sistema federativo americano, ganhando reconhecimento em 1959.
No entanto, as votações colocaram à mostra as profundas divergências entre os havaianos nativos: alguns querem reconhecimento formal da comunidade e uma relação diferente com os EUA; outros querem que o Havaí se separe completamente de Washington – ou, mais precisamente, querem que os EUA saiam do Havaí.
Autoridades americanas tiveram uma amostra da hostilidade na capital Honolulu, em junho de 2014: representantes de comunidades em uma audiência organizada pelo Departamento de Interior dos EUA tomaram o microfone para gritar frases como “Não precisamos de vocês aqui. Este é nosso país.” ou “Saiam de nossa casa! Vão embora.”
O Departamento do Interior americano iniciou naquele ano as audiências para saber se deveria oferecer um caminho para o reconhecimento federal da comunidade de havaianos nativos.
Este caminho já foi aberto para grupos de nativos americanos no continente, mas não aos descendentes dos indígenas havaianos.
Um ano depois, o Departamento do Interior publicou uma proposta de “procedimentos para restabelecer um relacionamento formal de governo para governo”.
 
Desejo de décadas
Nem todos estão felizes com a ideia da ‘aha. Alguns dos que poderiam votar ou até se candidatar ao cargo de delegados representantes disseram que vão boicotar o processo. Um candidato a delegado já desistiu da disputa afirmando que a ‘aha não é pono (certa ou justa, no idioma original haviano).
O reconhecimento federal é um desejo de ativistas há décadas, mas as tentativas anteriores no Congresso americano fracassaram.
No entanto, um havaiano importante em Washington fez o processo avançar: Barack Obama, que já demonstrou publicamente o apoio à causa dos havaianos.
Mas para aqueles que buscam o apoio de Obama o tempo está acabando: dentro de um ano ele deixa o cargo.
 
Nações dentro da nação
Os governos tribais dos nativos americanos agora formam uma nação dentro de uma nação. Estes governos têm suas próprias eleições, têm polícia própria, Justiça e outras infraestruturas de governo dentro das reservas.
Os nativos americanos são cidadãos de suas tribos, dos Estados Unidos e do Estado onde vivem. Mas as nações tribais ainda são “nações dependentes domesticamente”.
No caso do Havaí, o reconhecimento poderá definir os nativos como uma entidade política separada – protegendo muitos dos programas federais que atualmente ajudam estes nativos como, financiamento imobiliário facilitado, planos de saúde, bolsas de educação e culturais.
Também vai permitir uma independência econômica, apesar de um dos setores que enriqueceu algumas tribos americanas, o jogo, ser proibido no Havaí.
No entanto tudo isto está baseado na ideia de que o governo americano é a autoridade legítima no Havaí, algo que uma parcela pequena porém crescente dos havaianos já não acredita mais.
Williamson Chang, professor de direito na Universidade do Havaí, é um destes. Ele afirma que, de acordo com a lei internacional, um país pode anexar outro apenas por meio de um tratado, um documento que as duas partes assinam.
Qualquer outro tipo de acordo, incluindo o que aconteceu no Havaí, é uma ocupação, segundo Chang.
 
História
O Havaí é um grupo de ilhas a mais de 4 mil quilômetros do continente. Em 1893, empresários brancos e políticos, com a ajuda de militares americanos, derrubaram uma monarquia constitucional.
Os líderes do golpe esperavam que as ilhas fossem anexadas imediatamente aos Estados Unidos, mas o então presidente Grover Cleveland rejeitou a ideia e disse que o envolvimento dos americanos no golpe era uma “vergonha”.
Três anos depois, um tratado para a anexação não passou no Senado devido ao lobby da rainha deposta Liliuokalani e também de dezenas de milhares de petições de havaianos que eram contra a anexação.
No ano seguinte, com a luta no Pacífico devido à Guerra entre espanhóis e americanos e um novo presidente no cargo, o Congresso aprovou a anexação do Havaí.
Os Estados Unidos pediram desculpas formais em 1993 pelo papel que tiveram na derrubada do reino mas, até agora, o governo não se pronunciou quanto à legalidade da anexação.
“Definitivamente há erros na forma pela qual o Havaí e suas terras foram transferidos para os Estados Unidos”, disse Melody Kapilialoha Mackenzie, professora de direito na Universidade do Havaí.
“Mas, para mim, a questão é: para onde você leva estas questões? Existe algum fórum no qual esta voz pode ser ouvida?”
 
Sem passado
O que todos parecem concordar é com o tamanho do dano que a presença americana causou aos havaianos nativos.
Peter Apo afirma que passou quase metade dos 75 anos de sua vida “sem saber quem diabos eu era “.
“A única coisa que eu sabia sobre havaianos era o que via na televisão e propagandas de turismo”, disse. Atualmente ele é um dos administradores do Escritório para Negócios Havaianos, uma agência estatal.
Na época da derrubada do reino, em 1893, a população havaiana tinha caído de pelo menos 400 mil pessoas para menos de 40 mil, tudo em apenas um século. Depois da anexação, estudantes não podiam falar havaiano na escola e o idioma quase morreu.
Kahoolawe, uma ilha de importância espiritual para os havaianos, foi usada como local de testes de bombas pelo Exército americano até a década de 1990. Ainda há bombas não explodidas na ilha, que já passou por uma tentativa de limpeza.
Atualmente os havaianos nativos apresentam os piores índices econômicos e de saúde entre os grupos étnicos do Havaí.
Joshua Lanakila Managuil, um jovem ativista que está concorrendo a uma vaga na ‘aha, afirmou que tem sorte de ser resultado da renascença política e cultural que tem ocorrido entre os havaianos nativos desde a década de 1970. Mas ele não aprova o modelo de reconhecimento federal vigente.
“Na minha opinião não é um modelo que vai garantir nossa segurança. Precisamos reconhecer o que foi feito e corrigir estas coisas”, afirmou.
 
Oposição
Williamson Chang estima que cerca de 60% dos comentários registrados durante as audiências do Departamento do Interior americano foram a favor do reconhecimento federal e ele suspeita que esta porcentagem corresponde ao que se pode encontrar na população havaiana.
“Eu diria que a maioria dos havaianos não concorda com soberania e independência – ou eles não conhecem a própria história ou acham que é muito tarde para nos separarmos dos Estados Unidos”, disse.
Depois de eleitos, os delegados representantes vão se reunir por 40 dias e a ‘aha deve terminar em abril.
Managuil afirmou que há divergências dentro do movimento pela independência quanto à participar ou não da ‘aha. Os havaianos a favor da independência sentem que a convenção é simplesmente um veículo para forçar a aceitação do reconhecimento federal.
“As pessoas estão agindo por causa do medo. Qualquer que seja o caminho escolhido, acho que precisaremos de mais tempo.”
Apo tem uma preferência clara, mas, o que quer que aconteça, “pelo menos será algo que os havaianos escolheram”, disse.
“Acho que, se pelo menos conseguirmos o relacionamento de governo para governo – o estágio que estamos negociando agora -, isso vai fechar os 123 anos com um bom fim para a história e um grande futuro para os havaianos, que serão capazes de manter sua identidade como um povo”.
 
Fonte: BBC
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